Escola pública estadual no Rio de Janeiro, com tratamento acústico, recebe LEED Schools
No Brasil, a Erich Walter Heine, primeira escola pública a receber a certificação de sustentabilidade
LEED, tem como um dos requisitos fundamentais o conforto acústico.
A
Escola Estadual Erich Walter Heine, situada em Santa Cruz, zona oeste do Rio de
Janeiro, é a primeira da América Latina a receber o certificado LEED Schools,
do Green Building Council. Construída pela ThyssenKrupp CSA, por meio de uma
PPP com o Governo do Estado e a prefeitura do Rio de Janeiro, a unidade passou
por uma série de inspeções do LEED, depois da inauguração em maio de 2011, que
atestaram a eficácia das mais de 50 medidas de sustentabilidade adotadas, entre
elas o conforto acústico e a redução em até 40% do consumo de energia.
Com
investimento de R$ 16 milhões, a obra contou com o uso de materiais
sustentáveis, utilização de lâmpadas LED, coleta seletiva de lixo, sistema de
aproveitamento de água da chuva e espaço de reciclagem e gestão dos resíduos da
obra. O ecotelhado, além de servir para aulas ao ar livre, conta com uma
vegetação especial que diminui a absorção de calor e de ruídos e retém a água
da chuva. O escritório de arquitetura Arktectus foi o responsável pelo projeto,
que desde o desenvolvimento à execução da obra, adotou várias soluções para
atender aos requisitos da certificação LEED, desde a implantação no terreno,
até os amplos vãos para a circulação de ar.
Projeto CE Erich Walter Heine. Pavimento da Cobertura A última laje foi impermeabilizada com manta e emulsão à base de água, coberta pelo Ecotelhado, cuja composição é a aplicação de duas mantas plásticas recicladas, suporte emborrachado, substrato orgânico e vegetação |
Detalhe do Ecotelhado instalado |
Coletores solares para aquecimento de chuveiros no vestiário |
O
edifício é dividido em quatro módulos, posicionados sobre o terreno em forma de
catavento, com pátio interno no centro, o que permite a ventilação natural entre
os ambientes, promovendo a circulação de ar interna com exaustão por meio de uma
claraboia. Para o maior aproveitamento da luz natural, os corredores estão
voltados para o pátio.
Segundo
a arquiteta Maria José de Mello, sócia diretora da Arktectus, no caso de
escolas os ambientes isolados acusticamente são mais importantes do que se
imagina, principalmente para o trabalho do professor e dos alunos. “A qualidade
de vida e as tarefas dos professores são afetadas pela questão acústica, que sofrem
constantemente com calos vocais, por forçarem a voz para serem ouvidos. Já para
os alunos, um bom projeto acústico, além de aumentar a concentração, acaba
facilitando o bom entendimento das matérias e, ainda, os educam a falar mais
baixo, permitindo conforto ao ouvir”, explica.
Outro
problema nas escolas é o ruído externo, que acaba disputando com o barulho que
naturalmente acontece dentro das salas. “Por isso, além do desconforto
auditivo, os profissionais da área sofrem problemas de saúde. Como trabalhei muito
com projetos de escolas, para as secretarias de educação do estado e de
municípios, vi muito professor ficar de licença médica”, destaca Maria José. Mas
este não é o caso da Erich Walter Heine, pois a escola está implantada no
centro de um conjunto habitacional, com pouco comércio local e baixo nível de
ruído, principalmente porque os transportes públicos passam numa via a
aproximadamente 500 m de distância.
Tratamento acústico
O
caso da Escola Estadual Erich Walter Heine é bastante especial do ponto de
vista da acústica. Para Maria José, infelizmente, nas escolas em geral essa
realidade fica muito distante, pois não há uma conscientização a respeito do
tratamento acústico. Segundo a arquiteta, nesse caso, além dos aspectos de
sustentabilidade, o LEED Schools V 3.0 tem um pré-requisito obrigatório para
escolas, que é o tratamento acústico. “Sabemos que onde há 20 ou mais
crianças/pessoas, que podem falar ao mesmo tempo, esse tratamento promove
qualidade e conforto acústico, facilitando o ensino”.
A
falta de ambientes acusticamente tratados nas escolas gera ainda problemas de
inteligibilidade e falta de concentração dos alunos. Por isso, os principais
pontos a serem considerados num projeto de acústica para escolas são os pisos,
paredes e tetos, com cálculo e aferimento do volume máximo em decibéis. “Na
Erich Walter Heine, as salas não puderam ultrapassar os 45 dB, recomendados
pela norma brasileira para escolas. Com isso, tivemos de dobrar as espessuras
das paredes externas, aumentar a dos vidros laminados e dar uma atenção
especial às esquadrias com isolamento acústico. O forro mineral escolhido foi o
que apresentou melhor performance acústica. O piso monolítico sem encaixes e as
portas mais espessas contribuíram para o isolamento acústico”, destaca.
Maria
José lembra ainda que o projeto de instalações e climatização teve de ser
adaptado, a fim de reduzir ruídos. “Substituímos o ar condicionado de parede e
especificamos os do tipo Split, com troca de ar por meio de ventilação mecânica
dutada. As casas de máquinas receberam piso emborrachado para absorver a
vibração dos aparelhos de exaustão mecânica. E os condensadores foram apoiados
na camada de telhado verde, o que também contribuiu para absorção de ruído”,
explica.
No
telhado verde, que por si só tem papel de isolante termoacústico, foi utilizado
o sistema modular alveolar do tipo galocha em EVA. A cobertura é um pavimento útil, com aulas ao
ar livre e visitação aberta ao público.
Iniciativas promissoras
Para
se ter uma ideia do tamanho do problema relacionado à acústica nas escolas, a
arquiteta afirma que, em 2010, foram distribuídos microfones e caixas de som para
os professores estaduais. “No entanto, algumas iniciativas promissoras começam
a se disseminar. Nas escolas municipais do Rio de Janeiro, há informação de que
as novas unidades estão sendo construídas com o tratamento acústico. Em São
Paulo, o Fundação de Desenvolvimento da Educação (FDE), ligada a Secretaria
Estadual de Educação, propôs o tratamento acústico de unidades, com utilização
de materiais como placas de forro mineral, na execução de obras de adequação e ‘retrofit’
, como parte integrante em seus cadernos técnicos, visando ações de
sustentabilidade nas escolas públicas”.
Segundo
ela, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), autarquia federal,
responsável pela execução de políticas educacionais do Ministério da Educação, também
vem priorizando a sustentabilidade, que inclui o conforto acústico como parte
importante na construção de novas creches e escolas de primeiro grau pelo país.
Maria
José descreve ainda os bons resultados dos alunos da escola. Além de o projeto
ter sido considerado pioneiro, recebeu vários prêmios individuais e coletivos. “Logo
no primeiro ano, cinco alunos da Heine foram os primeiros colocados em um
concurso nacional, que escolheu os seis melhores projetos acadêmicos sobre leis
ambientais. Em 2011, outro aluno recebeu a primeira medalha de ouro de uma
escola pública na Olimpíada de Matemática”, observa a arquiteta.