Conforto acústico nas edificações depende de nova cultura e ação integrada
Título | Conforto acústico nas edificações depende de nova cultura e ação integrada
Fonte | Portal AECweb – Conexão AEC – Agosto/2014
Autoria | Redação Portal
Entrevista | Davi Akkerman, presidente da ProAcústica
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Conforto acústico nas edificações depende de nova cultura e ação integrada
É necessário que todos os agentes envolvidos se empenhem no desenvolvimento de novos empreendimentos conformes à NBR 15575
Fundada há quase três anos, a ProAcústica – Associação Brasileira para a Qualidade Acústica – tem estado à frente dos debates sobre acústica ambiental e de edificações. Em entrevista ao Portal AECweb, Davi Akkerman fala das realizações da associação, das exigências que a ABNT NBR 15575 impacta no setor, e dos papeis de cada elo da cadeia para alcançar o melhor desempenho acústico.
AECweb – Qual foi a evolução da ProAcústica desde a sua criação?
Davi Akkerman – A entidade, criada oficialmente no final de 2011, conta atualmente com 66 associados, entre fundadores, efetivos e beneméritos. São 37 empresas fabricantes de produtos acústicos, 16 consultorias e projetistas e sete empresas de instalação e distribuição. Nestes três anos, a ProAcústica está se firmando como referência na área e tem estado à frente de todos os debates sobre acústica de edificações e ambiental. A associação vem cumprindo seus objetivos iniciais, de divulgar e promover a qualidade acústica nas edificações e meio ambiente, seja através da realização de eventos e palestras, ou ainda promovendo a formação de engenheiros, arquitetos e urbanistas, oferecendo cursos e workshops nas diversas áreas de atuação da acústica.
AECweb – Qual a atuação da entidade em relação às normas técnicas?
Akkerman – A ProAcústica participa ativamente da revisão das normas técnicas de acústica; na Comissão de Estudo de Desempenho Acústico de Edificações (CE-02:135.01); na Comissão de Estudo Especial de Acústica (CEE-196) da ABNT; na norma de desempenho (ABNT NBR 15575), com colaboração direta na sua revisão e adequação; no Dia Internacional da Conscientização sobre o ruído, realizado em abril; e trazendo para o debate público a necessidade de mapeamento acústico das cidades brasileiras, como forma de melhor gerir as grandes problemáticas relativas ao ruído urbano, entre outros temas.
AECweb – É possível mensurar a colaboração da ProAcústica na contenção do ruído nas grandes cidades brasileiras?
Akkerman – Conter o ruído nas grandes cidades é trabalho de longo prazo e depende da implementação de instrumentos ainda desconhecidos no planejamento urbano no Brasil, como a proposta divulgada pela ProAcústica de mapeamento acústico. Trata-se de ferramenta de apoio ao planejamento e ordenamento urbano, com vista à redução e gestão de ruído nas cidades. Assim, as prefeituras podem elaborar planos e estabelecer regras para exploração de atividades com emissões sonoras significativas, ou interditá-las, quando o ruído exceder os valores regulamentares.
AECweb – A sociedade já discute o uso deste instrumento?
Akkerman – A ferramenta tomou impulso a partir da Conferência Municipal sobre Ruído, Vibração e Perturbação Sonora, realizada recentemente através de parceria entre a ProAcústica e a Câmara Municipal de São Paulo. O tema deverá representar mudança significativa na qualidade de vida nas cidades, impactando não somente o mercado de acústica ambiental, mas também das edificações, pois a gestão do ruído urbano visa orientar a Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (LPUOS), além de servir de base para o Estudo de Impacto de Vizinhança e Relatório de Impacto de Vizinhança (EIV/RIV) em casos de licenciamento.
AECweb – A entrada em vigor da ABNT NBR 15575 foi decisiva para agregar conforto acústico às construções?
Akkerman – Sem dúvida a norma de desempenho, que entrou em exigibilidade em julho de 2013, é um dos instrumentos para a melhoria da especificação, projeto e construção, com destaque para o conforto acústico. Será preciso que todos os agentes envolvidos incorporem efetivamente essa nova cultura às práticas de desenvolvimento de novos empreendimentos residenciais e, assim, agregar de fato, o conforto acústico às edificações.
ECweb – Fornecedores de um lado, construtoras de outro. Qual o elo da cadeia que melhor se apropriou da norma de desempenho?
Akkerman – A indústria fornecedora da construção civil deve se aprimorar na caracterização de seus produtos e sistemas, por meio de ensaios que demonstrem o desempenho de cada um. Já as construtoras estão buscando incorporar as soluções acústicas no dia a dia de seus projetos e obras, de maneira a atender ao que prescreve a norma. De forma geral, todos têm muitas adaptações a fazer neste processo de apropriação e aplicação da norma de desempenho, a fim de garantir o resultado mais adequado e assegurar o direito dos consumidores.
AECweb – Até que ponto a sociedade já tomou consciência do seu direito ao conforto acústico dentro de casa?
Akkerman – Apesar da grande dificuldade de saber para quem reclamar, os usuários vêm manifestando há tempos suas insatisfações com o desconforto acústico nos edifícios residenciais. Mas, de forma geral, a tomada de consciência do direito ao conforto acústico vem acompanhada de um processo de educação, informação e esclarecimento. Todos os envolvidos precisam contribuir para que a qualidade acústica nas edificações, e no meio ambiente, contribua de fato para a melhoria do bem-estar e da saúde pública, direito de todo cidadão.
AECweb – Crescem os segmentos da indústria que produzem sistemas e materiais destinados à redução do ruído? Quais?
Akkerman – Mais do que crescer, o que se constata num horizonte de médio prazo é a adequação da indústria no que diz respeito aos seus produtos/soluções destinados ao controle ou redução do ruído. Com certeza existirá espaço para a entrada de novos fornecedores. Qualidade, competitividade e informação técnica serão diferenciais importantes para a presença de novos players na indústria.
AECweb – Quais as soluções projetuais que estão e estarão em alta para responder às exigências de desempenho acústico?
Akkerman – Na verdade, nada de muito novo. O mercado deve se preparar para especificar as soluções mais adequadas nos diferentes tipos de projetos arquitetônicos para adaptação às exigências normativas. Outra medida importante é caracterização da ‘paisagem acústica’ dos terrenos e entornos dos futuros empreendimentos, estudo que ajuda a definir quais as soluções para fachadas, vedações e medidas para atenuação dos ruídos locais. Para o segmento econômico há uma demanda maior de inovações em relação ao desempenho de pisos em relação aos ruídos de impacto.
AECweb – Onde estão os pontos mais frágeis para atingir o desempenho previsto em normas, no projeto ou na construção?
Akkerman – No Brasil, ainda há um desconhecimento sobre como especificar desempenho e a respeito dos requisitos de acústica. Nesse momento inicial da exigibilidade da norma de desempenho, ainda há muitas dúvidas a respeito da quantificação e das soluções acústicas para alcançar as exigências. Será preciso um grande esforço da cadeia produtiva da construção no sentido de caracterizar produtos e sistemas. Será preciso, por exemplo, ensaiar não apenas o bloco de alvenaria, mas o sistema de parede, com todos os intervenientes, como janelas, portas e os demais componentes, a fim de obter o desempenho acústico real da tipologia adotada. Os projetistas terão de especificar com mais conhecimento e os fabricantes terão de adquirir a cultura do ensaio, a fim de definir níveis de desempenho de seus produtos e sistemas.
AECweb – Neste cenário, qual o papel de cada elo da cadeia produtiva?
Akkerman – Profissionais de projeto estão, de fato, diante de uma questão inerente à sua atividade, que é a responsabilidade técnica pelo que projetam e especificam. As construtoras, por sua vez, responsáveis pela viabilização dos projetos, precisam garantir o desempenho do que executam. A cadeia de fornecedores também está em uma situação de pressão para atender às novas necessidades de mercado, principalmente os fabricantes de portas, janelas e blocos de alvenaria, que precisam desenvolver soluções e ensaiar seus produtos.
AECweb – Além da norma de desempenho, quais as normas prescritivas de acústica que o arquiteto deve conhecer?
Akkerman – Basicamente as duas normas específicas de acústica que se aplicam à indústria da construção civil, a ABNT NBR 10151 e ABNT NBR 10152. Porém, desde 2013, a ProAcústica vem promovendo cursos sobre a norma de desempenho e a acústica, a fim de orientar os profissionais na aplicação dos quesitos da norma e de melhorar o desempenho acústico das edificações.
AECweb – Em quais casos é indispensável o projeto contar com consultoria de acústica?
Akkerman – Com a norma de desempenho, no mínimo, uma consultoria de acústica deve estar contemplada nos empreendimentos para verificação e classificação objetiva dos terrenos, além da análise e adequação das vedações externas e internas.
AECweb – Quais as suas perspectivas em relação ao futuro da acústica no Brasil, considerando a geração de ruído e a produção de edificações com melhor desempenho acústico?
Akkerman – O setor de acústica já registra um crescimento e a norma de desempenho, por exemplo, é um dos grandes propulsores dessa demanda. A procura por especialistas em acústica vem aumentando e em todo o país se multiplicam os pedidos de avaliações, ensaios de desempenho acústico e simulação de desempenho, por meio de softwares, para edifícios em fase de projeto. A indústria fornecedora de produtos e sistemas, por sua vez, irá também contar com um grande incremento. Além disso, quanto mais se expandem os centros urbanos, maior tende a ser o desenvolvimento da acústica ambiental no Brasil, pois são cada vez mais numerosas as fontes de ruído presentes nas cidades.
Colaborou para esta matéria:
Davi Akkerman – Engenheiro civil formado pela Universidade Mackenzie, com mestrado no Institute of Soundand Vibration Research, de Southamptom (Grã Bretanha). Tem especialização em Controle de Ruído Industrial pelo IPT. É membro eleito do Institute of Accoustic (Grã Bretanha) e diretor da Harmonia Davi Akkerman + Holtz, escritório de consultoria e projetos acústicos. Exerce seu segundo mandato como presidente da ProAcústica – Associação Brasileira para a Qualidade Acústica.