Prédios têm lei do silêncio
Título | Prédios têm lei do silêncio
Autor | Glynner Brandão
Fonte | Diário de Pernambuco – Vida Urbana
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Legislação voltada para inibir ruídos vigora há nove meses, mas ainda é pouco conhecida
Quem mora em prédio sabe bem. O barulho que vem do salão de festas traz muito transtorno. Pouco conhecida, a lei municipal 17.667, de 16 de dezembro de 2010, obriga as construtoras a entregar os salões dos edifícios do Recife equipados de isolamento acústico. A meta é evitar que o som em excesso se propague para fora do ambiente. Os prédios concebidos antes da lei têm cinco anos para se adequar. A norma pegou de surpresa até os sindicatos ligados à construção civil de Pernambuco.
A legislação foi homologada em dezembro de 2010, quando passou a vigorar. Na prática, ela fixa o tratamento acústico em 70 decibéis, valor correspondente ao nível do som de uma rua normal. Hoje, no mercado imobiliário, lã de vidro, lã de rocha, alvenaria, sonex (espécie de espuma com densidade para absorver ruídos), portas acústicas, gesso acartonado e antecâmaras são os materiais usados para filtrar os ruídos. A norma não diz o produto a ser utilizado.
De janeiro a julho deste ano, o Disque-Denúncia recebeu 3.702 ligações de poluição sonora. São quase 17 telefonemas por dia. Um levantamento feito pela instituição em abril mostrou que os vizinhos continuam sendo os maiores motivos de incômodo sonoro, gerando 43% das reclamações. O ruídos das ruas (carros de som e carrocinhas de CD) estão em segundo, com 17%, seguidos dos bares, com 17%, dos galpões e obras da construção civil (13%) e das igrejas (4%).
“Mais informadas de seus direitos, as pessoas passaram a denunciar os abusos cometidos a qualquer horário, cobrando atuação das autoridades”, contou Carmela Galindo, coordenadora do Disque-Denúncia. O estudo revelou que em 35% dos casos os ruídos aparecem em mais de um turno do dia. A noite é o segundo período mais barulheto, com 31%, e à tarde acontecem 19% dos casos. As ocorrências da manhã geram 10% das reclamações e as da madrugada apenas 5%. O Disque-Denúncia funciona 24 horas por dia. Os telefones são 3421-9595 e (81) 3719 4545.
Grande Recife gera maioria das queixas
Capital responde por 51% das denúncias de poluição sonora em Pernambuco
O Recife soma 51% de todas as reclamações que chegam ao Disque Denúncia. A capital é seguida por Caruaru, com 12%, Jaboatão dos Guararapes (11%), e Olinda (9%). Entre os bairros da capital, as localidades que mais originam quaixas são Boa Viagem, Ibura e Casa Amarela. “A lei colabora para a política da boa vizinhança. Desavenças e casos de violência são comuns por questões de barulho em prédios. A ideia é fazer com que as pessoas vivam melhor”, contou o idealizador, o deputado estadual Gustavo Negromonte (PMDB). Também há leis semelhantes em vigor em São Paulo e outras cidades do Sudeste. O processo de isolamento acústico de um salão de festa custa entre R$ 40 mil e R$ 80 mil.
A lei ainda é desconhecida pelo Secovi. “Não estou sabendo, mas vamos procurar nos informar a respeito”, disse Genival Aguiar, diretor do departamento de condomínios do sindicato. A instituição prometeu consultar seu setor jurídico sobre o assunto na próxima segunda-feira. O Sinduscon/PE também informou que desconhece a lei municipal.
De acordo com Marcello Gomes, presidente do Conselho Consultivo da Ademi, a nova lei é positiva. “Discutimos isso há um ano. Vai melhorar a convivência urbana. As empresas associadas estão cientes da regra”.
O engenheiro civil Frederico Brennand propõe a expansão da legislação para as áreas de acomodação de máquinas dos prédios, salas de ginástica e salões de jogos. “Elas podem produzir níveis sonoros acima de 70 decibéis. O projeto para salões de festas saem mais baratos do que os efeitos, como você ter que parar um evento”, atestou. Segundo ele, a lei ainda deixa brechas na sua interpretação. “Ainda não está totalmente clara. Algumas empresas estão querendo burlar o processo modificando o nome salão de festas por outro”, revelou. Cada prédio exige um projeto específico.
A regra é mais uma ferramenta para coibir a poluição sonora e melhorar o convívio entre condôminos. No Edifício Villa Bella, no bairro do Espinheiro, o salão de festa ainda não recebeu o isolamento. É o bom senso que ajuda a evitar os excessos. “Eu não conhecia a lei, mas iremos nos adequar. Os moradores estão se entendendo até agora”, explicou o síndico Clay Reis, 61. As construtoras que atuam no Recife garantem que entregarão os novos edifícios já com as novas regras. “A construtora está antenada à novidade. A poluição sonora é crime”, revelou o engenheiro responsável pelo Condomínio Cais da Aurora, erguido em Santo Amaro. O prédio da Conic terá 35 andares.
Saiba mais
O que diz a cartilha:
| A poluição sonora é qualquer emissão de som ou ruído que resulte em ofensa à saúde, à segurança, ao sossego ou ao bem-estar das pessoas.
| O barulho não é permitido em nenhum horário do dia. A máxima de que as pessoas podem abusar do som entre 8h e 22h não é válida.
| Pequenos ruídos e mesmo sons baixos emitidos, por exemplo, por um rádio, podem ser tão incômodos e nocivos à saúde quanto outras fontes poluidoras.
Onde procurar ajuda?
Se o caso de poluição envolve um vizinho, o denunciante pode procurar a Defensoria Pública ou um advogado para negociar uma solução amigável. Se o problema envolve muitas pessoas, a Polícia Militar, o Poder Judiciário e o Ministério Público também devem ser acionados.
A poluição sonora pode ser crime e contravenção. É crime quando afeta a saúde de alguém e contravenção penal sempre que compromete o trabalho ou sossego.
Diversas leis preveem a aplicação de multa pela prática de poluição sonora, sem contar com a responsabilização penal do infrator (pode ser preso em flagrante).
Para se documentar sobre a ocorrência, a pessoa pode gravar o áudio. Sempre que possível relate por escrito e de forma minuciosa as dificuldades enfrentadas.
Fontes: Lei municipal 17.667 e MPPE
Entrevista: André Silvani, promotor
A lei é positiva?
O grande avanço da lei é estabelecer medidas preventivas à poluição sonora. Ela contribui para a paz social. Deve ser aplaudida, porque é um mecanismo positivo. Atualmente, o Estado espera os abusos para agir. O novo mecanismo é preventivo. Só lamento um fato: a lei deveria ser mais abrangente nas hipóteses, se estendendo para todo e qualquer empreendimento que desenvolva alguma atividade de entretenimento, como, por exemplo, bares e casas de espetáculos.
O lado negativo seria não estabelecer punições?
A lei não prevê punições, mas nos casos em que os projetos de acústica não existirem, as licenças de instalação e operação, com a emissão do habite-se, não são fornecidas. Hoje, a poluição sonora pode resultar em sanções administrativas, como multa e cassação do alvará do estabelecimento e processos na esfera cível. Os infratores também podem ser processados penalmente pelo Ministério Público. As punições podem ser aplicadas de forma simultânea para responsabilizar o infrator. As pessoas podem acionar as polícias Civil e Militar, pois elas têm poder de prisão.
O que é a poluição sonora?
Quando os ruídos são mais leves e afetam o trabalho ou o descanso de alguém configura-se a perturbação do sossego. É uma contravenção penal. É um crime.