Complexo cultural no Centro de São Paulo emprega sistema box in box com forros e paredes flutuantes para blindagem sonora
Projeto das salas de música, teatro e dança da Praça das Artes atingiu um grau de excelência em termos de isolamento acústico.
Endereço de visitação e aprendizagem para estudantes de arquitetura de diferentes países no centro de São Paulo, a Praça das Artes, projetada em 2006 pela Brasil Arquitetura, constitui um dos mais notáveis exemplos de centros de estudo e de apresentação de artes performáticas, fonte de encantamento que, de resto, cumpre com as funções de educação em música, teatro e dança. A Praça das Artes recebeu o prêmio de melhor obra de arquitetura da Associação Paulista de Críticos de Arte em 2012, ano da inauguração, além do Icon Awards 2013 da revista inglesa Icon, como a melhor obra do ano, vencendo alguns dos mais renomados arquitetos do mundo. O complexo cultural, que funciona como uma extensão do Teatro Municipal, compreende três blocos: o prédio dos Corpos Artísticos, o prédio das Escolas e a sala do Conservatório numa área com mais de 28 mil m2, incluindo o estacionamento.
Fotos: Nelson Kon
O prédio dos Corpos Artísticos foi construído por volta da primeira metade dos anos 30 como um clube de pelota basca e, em 1952, como cine Cairo. À época do projeto, funcionava um decadente cinema e do edifício original só ficou a fachada. A construção por trás da fachada era muito precária: um galpão com uma cobertura em estrutura metálica, sem nenhum interesse arquitetônico. Como nada era tombado, os arquitetos resolveram preservar a fachada, como um registro da memória da paisagem do Centro. O edifício abriga ensaios de música, canto e dança, além de outra sala de grande dimensão para orquestra e ensaio de ópera.
Fotos: Nelson Kon
No projeto acústico da Praça das Artes, executado pelo escritório Acústica & Sônica, “a arquitetura e acústica estão tão amalgamadas – como é esperado mesmo que sejam – que é inviável dissociar as partes. Por exemplo, as paredes externas da edificação são todas em concreto, que têm um excelente rendimento em termos de isolamento acústico. Não faria sentido recobrir as paredes de concreto do lado de dentro e o concreto foi utilizado como parte das composições internas, alternando com sistemas especiais de difusão e absorção sonora”, relembra o arquiteto José Augusto Nepomuceno, consultor principal do escritório. Os sistemas de difusão foram construídos em madeira e os de absorção, ora com lã de vidro e tecido, ora com madeira MDF ranhurada e perfurada com lã de vidro na parte posterior.
Fotos: Nelson Kon
O prédio das Escolas abriga a Escola de Dança de São Paulo e a Escola Municipal de Música. A sala do Conservatório – conhecido como Conservatório Dramático e Musical, cujas atividades começaram em 1906 – abriga a sede do Quarteto de Cordas.
Fotos: Nelson Kon
As exigências para a acústica neste tipo de projeto é levado ao extremo: ambientes que requerem baixos níveis de ruído; adjacências que demandam alto isolamento acústico de ruído aéreo tanto para paredes como para lajes; isolamento de transmissão estrutural; controle sobre os parâmetros de acústica de sala tais como reverberação e níveis de audibilidade.
Fotos: Nelson Kon
A Escola de Dança foi fundada em 1940 para formar bailarinos do teatro Municipal e, hoje, atende mais de 800 alunos de cursos livres, balé para homens e preparatórios para crianças. A Escola de Música da Praça forma músicos sinfônicos, regentes, cantores líricos e instrumentistas de saxofone, cravo, piano complementar, flauta doce e violão. Foi criada em 1969.
Uma vez definidos os parâmetros acústicos de cada sala, os acabamentos foram todos, sem exceção, estabelecidos em conjunto entre os escritórios Brasil Arquitetura e Acústica & Sônica, no que diz respeito à distribuição, cores e especificações de materiais. Os padrões de isolamento acústico no prédio dos Corpos Artísticos são os mais elevados entre os prédios da Praça das Artes. As necessidades de isolamento aéreo vertical (entre os andares) impuseram a construção de lajes estruturais robustas com frequência natural na ordem de 7 Hz e, sobre essas, lajes flutuantes. Em alguns casos são suspensas com isoladores em mola, em outros, com isoladores de borracha natural.
Fotos: Nelson Kon
Para estes sistemas o isolamento de ruído aéreo foi testado no em laboratório fora do Brasil, com um Rw 79. Em certas situações, para alcançar a demanda de isolamento acústico destas construções “empilhadas” foi necessário utilizar construções box in box com forros e paredes flutuantes para blindagem sonora, em complemento à laje flutuante. As paredes que dividem os espaços foram entregues em blocos de concreto preenchidos com grout. Sobre as paredes foram instalados os sistemas flutuantes de blindagem e os acabamentos acústicos.
Nas áreas de dança, sejam nos prédios dos Corpos Artísticos ou das Escolas, os assoalhos são todos flutuantes para comportar o movimento incessante das coreografias. O revestimento acústico nestes locais foi dimensionado para proporcionar conforto e inteligibilidade, utilizando parâmetros diferentes daqueles adotados nas áreas de escuta sensível da música. No prédio das Escolas, padrões semelhantes ao do prédio dos Corpos Artísticos foram adotados, com demandas menores em termos de isolamento. Uma preocupação digna de nota da colaboração entre os escritórios de arquitetura e o de acústica foi a definição das dimensões das salas de música: deveriam atender às questões de escuta (controle de nível de audibilidade, por exemplo), programa (número de alunos, instrumentos e uso), circulações dentro de um terreno com limitações e com flexibilidade reduzida.